Algumas pessoas nascem para serem cuidadas. O tempo todo precisando de uma palavra amiga, um abraço, algo que a toque de leve e a faça seguir adiante o caminho. Ora, alguém precisa cuidar e bom, digamos que eu sempre fui da categoria de pessoas que cuida. Nunca gostei muito de ser o centro de preocupações, de ter alguém destrinchando meu caos e mexendo na bagunça de ser quem eu sou para de alguma forma me ajudar. Não, definitivamente não cai bem em mim ser desvendado. Ao contrário. Gosto de conhecer as pessoas, entendê-las, ajudá-las, desde os mais corriqueiros problemas até as gigantes crises existenciais.
Mas as coisas mudam. A vida não escolhe categorias nem rótulos para saber quem irá golpear nos próximos minutos desse grande jogo de se viver. E já vivi muito para entender que um carinho a mais nunca faz mal, principalmente quando esse carinho vem de você mesmo. A vida acontece de repente e, às vezes, na ânsia de cuidarmos dos outros simplesmente nos largamos em um canto mal iluminado do quarto, milimetricamente calculado para que não nos lembremos de que somos frágeis e também precisamos de cuidado. Mas precisamos. Eu preciso. Também tenho problemas corriqueiros e só Deus sabe quantas crises existenciais me pegaram no colo e me embalaram noites de insônia.
Penso demais. Penso demais nas lágrimas e sorrisos alheios. Não de uma forma crítica, longe de mim. Apenas sinto que posso ajudar, e ajudo! Mas sempre me esqueço de mim. Então os dias na faculdade vão passando, as pessoas vêm e vão, o trabalho entediante continua, o almoço vai perdendo o sabor, as noites se tornam cansativas e eu simplesmente fecho os olhos para tudo isso que se passa comigo. Mas chega um momento que se esgota. Que pesa no peito todas as horas que não foram tiradas para se viver os próprios sorrisos, todas as tardes desperdiçando os pequenos prazeres, todas as noites ignorando a própria alegria – uma que fosse mais sobre estar em paz junto com olhares sinceros do que sobre pessoas superficiais em lugares barulhentos.
No entanto, agora minha visão do universo parece ter mudado. Não é algo racional, mas algo que se sente. Algo de intuição. E a minha me diz que preciso cuidar de mim. Quase um dever, um requisito necessário para ser feliz. E eu confio cegamente nessas sensações que minha alma digita nos sentidos ocultos do meu corpo. Já cuidei de muita gente. Tenho muito crédito para gastar um pouco comigo. É como uma obrigação que sinto de doar a mim mesmo todos os sorrisos que deixei de lado durante as horas malgastas de uma vida meio cinza. Os caminhos, ruas, travessas e avenidas que pavimentam as minhas razões de felicidade estão por aí, bem como as casas, prédios, olhares, conversas, abraços, cafunés e beijos capazes de quebrar a ilusão de que a felicidade está no fim da jornada.
Está na hora desse livro que ando escrevendo desde o dia em que nasci mudar um pouco de clima. É preciso mais energia, mais impulso, mais vontade de viver. Mais autoconhecimento e descobrimento da felicidade. Entrega é fundamental. Entregar-me ao meu próprio interior, ao meu próprio universo. Cuidar dos meus astros e constelações e colidir minha harmonia com quem saiba me roubar um sorriso sincero. Não é que eu esteja mudando de categoria e indo para o lado dos que precisam ser cuidados. Digamos que só cansei da rotina e da chatice de pertencer a apenas um lugar. Meu coração é maior que isso. Agora estou nos dois lados da moeda. Vou cuidar. Vou ser cuidado.
Noyuke Silva