Cadê a vida que estava aqui?
Onde está meu eu, se não fui eu que escondi?
Em um imenso segundo tudo muda. É a morte e a vida caminhando lado a lado, a alegria e a dor partilhando o quarto, o parto, espatifando as expectativas aos prantos. Em cada canto, um cansaço.
Aço- as vezes acho que é disso que eu devia ser feita, defeito nenhum importa se eu estiver disponível e inteira- mas isso as vezes é imenso e pesado.
Só é preciso estar, mas isso significa ultrapassar: sono, medo, fadiga. Há quem diga, que é fácil, mas a verdadeira dica, é se entregar. Há que se deixar chorar enquanto doer.
Nesse momento intenso, a gente se despede de um tipo de corpo, de relacionamento, de interação social, de independência, de liberdade, de geografia espacial e de tempo, tão tão tão especial. Ao mesmo tempo em que se despe de qualquer egoismo e se doa, ainda que doa, sem parar.
É o fim de um ciclo, sem muito tempo de curtir a fossa. É aquela deprê sem que nem ao menos fazer um brigadeiro a gente possa.
Entre uma lágrima e outra, uma troca – de fralda, de roupa, de fase, de alma. E assim, o maior vínculo da sua existência vai se tecendo, em trama, em trauma, em turnos, em prosa, entoando o amor ainda que você ache que não possa, ou que não consiga, ainda que esteja meio torta ou aflita. Não tem atalho, é o próprio trabalho e cuidado seu veículo de melhora e regeneração, seu caminho de força. Só mesmo um novo amor pra te tirar dessa forca que é o término desse namoro com a antiga vida, com seu antigo eu- e é exatamente isso que o mundo, em generosidade, te deu.
No meio dessa onda e caos, fio a fio, hora a hora, mamada a mamada, olho a olho, uma relação acontece. Entre uma ou outra interrogação qualquer, um instante transparece, transcende, acende e aquece: surge o Amor.
É o poder do (re)encontro. Tinha previsão de chegada, mas é sem aviso prévio que você se vê, de repente, apaixonada.
O caminho é intermitente,
Há dias incríveis, extravagantes, felizes, fortes e quentes. Outros são secos, vorazes, minguados, carentes e fracos. Mas é aos poucos que vamos catando os cacos, nos organizando, cavando recursos e tapando os buracos para lidar com os novos cursos da vida.
Aceitamos fraquezas e vulnerabilidades, nosso lado mais humano vem à tona, ao ver esse novo humano sob nossa lona.
Nossas feridas mais profundas se abrem ao ouvirmos um choro infantil soluçar, e em parte é a gente ali também, que não para de chorar.
O cansaço faz cair qualquer filtro ou mácara de polidez, as vezes até a educação perde a vez.
Enfim, tudo aquilo que você se construiu se esparrama pelo chão. Quem fica ao lado nessa caminhada, merece prêmio de amigo-irmão.
Até que um dia, você olha em volta, e algo aconteceu.
Tudo mudou. TUDO.
Que bom.
A vida é mesmo imensidão e infinito, quando você acha que é o fim, tudo volta bem de novo ao início – e muito MUITO melhor do que antes.
Andrea Goes